Para quem passa a uma certa distância, a Paiol talvez pareça apenas isso: uma loja de produtos artesanais brasileiros na cidade de São Paulo. Mas para quem conhece o seu interior, ela se revela diferente: um encontro de narrativas, local onde as histórias de cada artesão e de cada peça exposta em suas prateleiras se cruzam com a de Lucas Lassen, seu idealizador, e dos caminhos percorridos por ele ao longo de mais de uma década de esforços para a construção de um trabalho de valorização, disseminação e sustentabilidade da produção artesanal brasileira.
Oficialmente, a Paiol foi fundada em 5 de novembro de 2007, mas a sua relação com a produção cultural e o artesanato do Brasil nasceu bem antes, lá no início dos anos 2000, quando Lucas estudava artes cênicas no Instituto de Arte e Ciência (Indac), em São Paulo.
Nesse tempo, Lucas, junto com o seu irmão, começou a comercializar tapetes tradicionais do artesanato mineiro, feitos com retalho de malharia na feira de artesanato do Shopping Frei Caneca, no bairro da Bela Vista.
Empolgado com os resultados e apaixonado pelo contato com um mundo novo ligado ao artesanato de tradição secular no interior de Minas Gerais, Lucas foi se aventurando cada vez mais por esse caminho.
É dessa época a descoberta das galinhas d’Angola esculpidas em madeira por dona Janete – sucesso de vendas junto com os tapetes e que, retrabalhadas pelo artista plástico Renato Diniz, formariam no futuro o símbolo da loja.
Após uma história de sete anos trabalhando em feiras da capital paulista – como aquela do Shopping Frei Caneca, no Shopping Center 3, em praças públicas como a da Benedito Calixto, em Pinheiros, e em supermercados e hipermercados –, Lucas, agora já sem a participação do irmão, que havia decidido dar outro rumo a seus negócios, sentiu a necessidade de encontrar um ponto fixo.
Sua primeira loja própria foi no bairro da Vila Mariana; desse espaço, migrou um ano depois para seu ponto hoje mais tradicional: a rua Frei Caneca. E foi lá que nasceu o nome “Paiol”, metáfora perfeita para a reunião de produtos e culturas que Lucas tinha descoberto ao longo do caminho.
Em 2010, Lucas aproximou-se do SEBRAE, quando começou a participar de rodadas de negócios artesanais, indo até estados do Norte e do Nordeste do país. Logo, começou a expandir a diversidade das peças que trazia para São Paulo.
Algo que Lucas se orgulha é que o projeto é democrático, pois beneficia com responsabilidade todas as partes envolvidas na cadeia produtiva: desde o produtor, que vende produtos a um preço justo, até a possibilidade atender a clientes de variados perfis, já que a Paiol possui peças de todos os preços.
Revendo os passos, Lucas avalia que o mais importante dentro do processo de construção da Paiol é a criação de vínculos reais pelo caminho; é um ramo de mercado que é feito por pessoas, onde as parcerias são vínculos. “Se eles crescerem, eu cresço e vice-versa. Não há relação de trabalho, há relação humana. É uma ‘bobagem’, mas é real e faz toda a diferença. É algo coletivo de fato. Essa forma de relacionamento vibra, vibra nas peças – o cliente sente”.
Hoje, ele explica que não oferece apenas produtos, mas peças com história e relevância social, que servem como presentes tanto para si quanto para os outros. Cada item é criado com o propósito de manter viva a memória de um momento especial ou de uma viagem.
Assim, com uma história recheada de desafios e graças a um trabalho de parceria e respeito entre equipe, fornecedores e clientes, a Paiol foi se tornando referência no mercado de arte popular.
Após a abertura de uma segunda unidade, na rua Fradique Coutinho (Pinheiros), o projeto começou a ter maior posicionamento no mundo virtual como próximo passo. “Jamais imaginei que a Paiol chegaria onde chegou, me sinto realizado. As coisas foram acontecendo e eu não tive cartilha: trabalho com cultura e a relação com teatro virou outra.” Avalia e pensa que o projeto deve continuar. “Cheguei a um lugar muito sincero e a loja chegou a um lugar que é o dela, 100% artesanal e 100% brasileiro, que deve continuar depois de mim.”
Nos anos seguintes, Lucas passou a viajar mais com o intuito de encontrar pessoalmente artistas representativos do país. Ele conheceu novos artesãos e suas produções, fez amizades e criou relações de afeto e de auxílio àqueles artistas que, de outra maneira, não possuíam recursos para terem sua arte conhecida em um centro distante como São Paulo.
Apoiando seu trabalho sempre na ideia do fair trade, a Paiol é hoje um exemplo do conceito de empresa social, abrindo novos mercados para esses artistas de uma forma sustentável e de respeito ao seu modo de produção.
Ao longo desses 10 anos, a Paiol cresceu e abriu uma filial na Rua Fradique Coutinho, no coração de Pinheiros. Juntas, as duas lojas atuam como vitrine e impulsionam a cultura popular e a cadeia produtiva do artesanato tradicional brasileiro, conforme idealizado por seu criador ao longo dos anos.