4 casais do artesanato brasileiro que criam peças cheias de afeto

O trabalho conjunto une as famílias e ajuda a alavancar os pequenos negócios de artesanato e arte popular por todo o Brasil

Por Ana Sachs

Yran Palmeira e Emeton Kroll com os ‘Pedidores de Abraços’, da Armoriarte – Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação

No mundo do artesanato, é comum encontrar casais que trabalham lado a lado na criação das peças do pequeno negócio familiar. A união acaba fortalecida e, muitas vezes, a atividade artística se estende a outros membros do núcleo, como filhos e netos.

“Eu percebo que, geralmente, um dos dois começa a produção, até que em dado momento, o número de pedidos começa a aumentar e o outro se sente incentivado a auxiliar”, conta Lucas Lassen, curador e diretor criativo da Paiol, lojas de artesanato de tradição e arte popular brasileira.

Conheça abaixo quatro casais unidos pelo amor e pela arte:

1. Yran e Emeton

Juntos há quase 20 anos, Yran Palmeira e Emeton Kroll moram em Caruaru (PE) desde 2008. Eles começaram as criações artísticas em 2015, por influência de um grande amigo, que acabou falecendo logo depois. Para lidar com o luto, usaram a pintura e a cerâmica como terapia.

A “Pedidora de Abraços” de Yran Palmeira e Emeton Kroll é moldada e pintada à mão — Foto: Theo Grahl / Divulgação

Juntos, eles criaram a Armoriarte, marca artística inspirada no movimento armorial, de Ariano Suassuna, que busca criar uma arte autêntica brasileira baseada nas raízes populares. Eles também trabalham com referências do pernambucano Francisco Brennand.

Os bonecos de braços abertos, criados por Emeton e batizados de “Pedidores de Abraços” por Yran, se tornaram o carro-chefe. Hoje, para adquirir uma das peças moldada e pintada à mão pelos dois é preciso esperar até 90 dias. “Acho que não eu conseguiria trabalhar por tanto tempo e com tanto prazer se não fosse ao lado de quem eu amo e de quem me ama também”, fala Yran.

2. Mestre Neguinha e Nanai

Maria do Carmo, mais conhecida como Mestre Neguinha, está com o marido, Arnaldo Guimarães, o Nanai, desde 1994. Mas foi somente há cerca de quatro anos que ele precisou pedir demissão do trabalho para auxiliar a esposa na produção de suas peças, que não para de crescer.

O casal Mestre Neguinha e Nanai trabalha junto há cerca de quatro anos — Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação

O salto se deu após conhecerem a artista plástica Ana Veloso, durante um projeto com foco em revitalizar a produção artesanal de Belo Jardim, no agreste pernambucano, onde o casal vive.

Criações com tamanduás, sereias e santos começaram a fazer sucesso, até que as famosas cabeças de barro – hoje reconhecidas no mundo todo – se transformaram em uma marca registrada.

As cabeças de barro viraram marca registrada do trabalho de Mestre Neguinha no mundo — Foto: Theo Grahl / Divulgação

“Tudo o que a gente tem hoje é fruto do artesanato e, desde então, não tivemos sequer um dia ruim. Pelo contrário, a gente sempre se deu muito bem, mas agora estamos cada mais próximos”, conta Nanai.

3. Marcos e Jaqueline

Filha, neta e bisneta de artesãs, Jaqueline Dias de Souza segue a tradição da família, que há cinco gerações trabalha com o barro no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. O marido, Marcos Lopes, começou a se interessar pela técnica em 2011. As visitas à casa da sogra, durante o namoro de quatro anos, o fizeram se encantar por todo o processo de produção das peças.

Jaqueline Dias de Souza e Marcos Lopes, que aprendeu a trabalhar o barro com a esposa — Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação

“Eu comecei aos pouquinhos, por incentivo da Jaqueline e da minha sogra, e logo já estava conciliando a produção com a função de operador de máquinas em construções”, afirma.

As peças de barro criadas por Jaqueline e Marcos junto com a família da artesã — Foto: Alexandre Disaro / Divulgação

Com o casamento em 2015 e, mais tarde, o nascimento da filha do casal, ele sentiu a necessidade de estar mais perto de casa. Com isso, o artesanato passou a ser o seu ofício principal. “O artesanato, hoje, para nós, além de representar qualidade de vida, acaba fortalecendo o nosso laço familiar”, diz o casal.

4. Adriana e Juliano

Adriana Souza e Juliano Martins se conheceram na escola quando os dois, já adultos, decidiram voltar a estudar. Ela trabalhava com artesanato desde os 19 anos e o convidou para atuar na profissão, pois ele havia acabado de perder o emprego à época.

Adriana Souza e Juliano Martins trabalham juntos na produção de esculturas de arte naif — Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação

“Eu não tinha muita noção do que ela fazia. Acabei indo conhecer e aprendi todo o processo de trabalho com a madeira, material que demanda um certo domínio para saber como cortar e entalhar”, relembra Juliano.

As esculturas de madeira de Adriana e Juliano são feitas de madeira talhada e pintadas à mão — Foto: Theo Grahl / Divulgação

Dezoito anos depois e com três filhos, o casal, que vive em Caraguatatuba, no litoral paulista, construiu a marca Casa das Casinhas, que produz esculturas de arte naif em madeira talhada por ele e finalizada com pinturas feitas por ela.

“A gente gosta de representar o cotidiano, o recorrente, mas sempre de uma forma mais leve, colorida e animada. É um estilo de vida, é um trabalho árduo, mas também é diversão e tem nos dado muita qualidade de vida”, comenta Adriana.

FEITO À MÃO GANHA DESTAQUE EM PROJETOS DA CASACOR

Arquitetos ressaltam técnicas artesanais em diversos ambientes

Matéria realizada e publicada por Angelo Miguel em https://megamoveleiros.com.br/publicacoes/feito-a-mao-ganha-destaque-em-projetos-da-casacor
Feito à mão ganha destaque em projetos da CASACOR

Desde o dia 30 de maio, está aberta a nova temporada da CASACOR, maior evento de arquitetura e decoração das Américas, que mistura arte, design e paisagismo em 73 ambientes pensados pelos principais nomes da decoração nacional. Em sua 36ª edição, os projetos se inspiram no tema Corpo & Morada, trazendo reflexões acerca  do corpo e suas relações com o espaço físico. Neste sentido, alguns projetos trazem um olhar apurado para as manualidades, sobretudo por trabalhos que valorizam as raízes artesanais brasileiras e que carregam consigo as histórias, técnicas e características do feito à mão espalhadas por regiões distintas do país. 

No espaço Ku’Ya, que pode ser definido como um loft-spa criado pelos arquitetos Stephanie Ribeiro, Gabriel Ramires e José Carrari Filho, a ancestralidade e contemporaneidade brasileira se misturam no Buffet Abrigo, obra da designer e artista Maria Fernanda Paes de Barros em parceria com artesãs indígenas da etnia Mehinaku, do Alto Xingu. “No nosso espaço, esta obra entra como um dos elementos centrais, não só pela sua estética original e atípica, mas também por ser resultado de uma conexão genuína que reposiciona o saber artesanal de uma comunidade indígena tradicional dentro do mercado contemporâneo”, revela Stephanie.

Produzida em uma edição limitada de apenas 8 peças, a obra foi concebida a partir de uma profunda escuta e da união horizontal de saberes, com o objetivo de transmitir uma mensagem de respeito, equidade e harmonia. Feito em cabreúva e com fios de algodão tingidos naturalmente, a peça utiliza cilindros de madeira maciça que remetem à uma técnica tradicional Mehinaku na produção de esteiras, trazendo valorização e visibilidade para o trabalho das mulheres da etnia. “Penso na decoração como um instrumento que nos permite olhar para dentro, para o que é produzido aqui e para a riqueza das tradições que permeiam o nosso país. Neste contexto, esta é uma obra que levanta questões importantes sobre a sustentabilidade do fazer artesanal e o potencial de impacto social do design”, completa Carrari. 

Outro espaço que se debruça sobre as manualidades é o Refúgio Conexão, criado pela arquiteta Isabella Nalon, que marca sua estreia na CASACOR. Inspirada no conceito de Slow Living, o ambiente de estar de 76m² propõe a busca por um olhar mais atencioso para consigo e com a forma como se lida com o próprio ritmo. “Acredito que é primordial pensar a casa como uma extensão de nós mesmos. Nosso olhar se volta para compreender como os ambientes podem contribuir para a nossa saúde física e mental e, dessa maneira, cada espaço deve refletir aquilo que mais funciona para cada um. Pensando em reduzir o ritmo, o artesanato brasileiro, em certa medida, nos traz a ideia de respeito ao tempo das coisas, do contato com o orgânico e nos desafia a valorizar as pequenas imperfeições que trazem singularidade às peças”, afirma a arquiteta.

Dentre as diversas obras artesanais que se destacam no Refúgio Conexão, há a coleção de vasos Cores e Mãos do Cerrado, uma parceria da Paiol, uma das principais lojas de arte popular e de artesanato de tradição do Brasil, em parceria com a artista paulistana Ju Amora, que fez pinturas inspiradas na estética do bioma. Idealizada por Lucas Lassen, a coleção de vasos é moldada a partir do barro por artesãs do Vale do Jequitinhonha, tradicional reduto de ceramistas em Minas Gerais. Para a intervenção nas peças, a pesquisa envolveu um estudo das diversas cores e referências culturais do cerrado, o que lhes permitiu chegar a uma paleta e a desenhos que ressaltam as características físicas e ambientais da região, propondo uma união linear de diferentes vivências e características artísticas.

Estante do espaço Refúgio Conexão com vasos da Coleção Cores e Mãos do Cerrado, feita por mulheres do Jequitinhonha – Foto Rafael Renzo

“Trazer o artesanal para os ambientes evoca a necessidade de olharmos para a decoração como uma ferramenta de valorização da brasilidade, de reconhecermos que uma das riquezas do Brasil está na criatividade, nas produções coletivas, na transmissão geracional e na manutenção desses saberes que formam a identidade do país”, finaliza Isabella.

Para além dos objetos

Obra de Derlon, no espaço de Mauro Contesini, e grafismos de Waxamani Mehinaku, no Espaço Motirõ, de Ester Carro – Fotos Angelo Miguel (esq) e André Mortatti/CASACOR

Nesta edição, além dos objetos, as técnicas de pintura também se destacam no diálogo entre a decoração e a arte popular. Em de 30m², o paisagista e engenheiro agrônomo Mauro Contesini – veterano de CASACOR – celebra a arte autêntica do nordeste, a simplicidade e resistência de seus artesãos. O recifense Derlon, reconhecido por uma estética que remete ao universo das Xilogravuras, foi um dos escolhidos para compor algumas obras nas paredes. Além de Derlon, o espaço conta com obras das ceramistas Dheny Santos e Leslie Bassi Gaffuri.

Outro projeto que destaca a pintura artística é o Motirõ, pensado pela arquiteta e urbanista social Ester Carro. Segundo ela, o ambiente de 34m² é um espaço de ativismo, sensibilização para o morar periférico e potência de habilidades ancestrais. Para tanto, ela convidou o jovem artista indigena Waxamani Mehinaku, que utiliza seu trabalho com grafismos autorais de sua etnia e o transporta para mobiliários desenhados pela designer Claudia Moreira Salles. “A intervenção foi criada pensando no futuro, no cuidado e nas adaptações que o habitar contemporâneo necessita. É um espaço coletivo que conecta mãos para construir”, finaliza Ester. 

Serviço

CASACOR SÃO PAULO 2023

30 de maio a 06 de agosto de 2023

Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, 2073.

Horário de Funcionamento: 

Terça a Sábado das 12h às 22h

Domingos e Feriados das 11h às 21h

https://casacor.abril.com.br/mostras/sao-paulo/


By Angelo Miguel | Bacuri Comunicação

Imagens: Créditos Rafael Renzo / Angelo Miguel / André Mortatti